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Mudanças Climáticas e seu impactos nos biomas Brasileiros

Os impactos das mudanças climáticas já estão em curso. Essas alterações têm promovido graves consequências nas vegetações naturais em diferentes escalas, incluindo aumento da mortalidade de árvores, perdas de biomassa florestal, mudanças no sequestro de carbono e, por fim, alteração em sua cobertura original. Os impactos desses fatores na biodiversidade também se refletem no fornecimento de serviços ecossistêmicos essenciais para o bem-estar humano relacionados à segurança alimentar, padrões de transmissão de doenças e sequestro de carbono. Dessa forma, reconhecer as áreas que serão mais afetadas é um importante passo para elaboração de estratégias de mitigação.

Nesse estudo nós abordamos como as mudanças climáticas do futuro próximo (50 anos) podem afetar a cobertura das vegetações no Brasil e quais seriam os efeitos sobre as áreas protegidas (unidades de conservação e terras indígenas). Para isso, usamos modelos climáticos já avaliados por relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), considerando cenários otimistas (conforme o já abandonado Acordo de París – de não exceder 1,5 - 2° C de temperatura global até final do século) e pessimista (o qual caminhamos a passos largos). Também utilizamos dados de solos de todo Brasil para melhor caracterizar as preferências ambientais de cada vegetação. A partir de metodologia de aprendizado de máquinas, treinamos nosso modelo para predizer a possível resposta das vegetações do Brasil a essa mudança da adequabilidade ambiental.

Considerando o cenário em que manteremos crescentes as taxas de emissões de CO2 atmosférico, podemos esperar mudanças significativas na adequabilidade ambiental (ou nicho fundamental) dos biomas do Brasil para 2070. Nesse cenário, grandes mudanças na cobertura vegetal poderão ocorrer. Estimamos que a área afetada no Brasil pode ser de 2.586.000 km2, o que seria equivalente a área do México e América Central juntas.

Os maios impactos são esperados para a porção sul e leste da bacia amazônica com marcante avanço do cerrado sobre as florestas, uma savanização no aspecto climático (Figura 1). Também é esperada a abertura de um corredor seco no estado do Pará, formado por vegetações resistentes a seca, como floresta estacional decidual e cerrado. Em toda bacia, é esperado uma redução de adequabilidade ambiental em até 24% de sua cobertura, sendo a floresta ombrófila aberta a formação vegetal mais impactada, podendo restar apenas 47% de sua cobertura de nicho original.


Figura 1. Mapa das vegetações do Brasil. (a) Distribuição atual; (b) distribuição modelada segundo a adequabilidade ambiental para 2070.


Também são esperados grandes impactos para a região nordeste do país, com significativa expansão da caatinga (41%) sobre as florestas estacionais deciduais. Estas florestas representam um ecossistema de transição entre o clima semiárido e o tropical sazonal. Nesse contexto, é projetado que apenas 53% da cobertura original de florestas estacionais deciduais manterá sua adequabilidade ambiental, e que, com o aumento da aridez, haja uma significativa expansão para a região norte do país.

Porém, cabe destacar que a dinâmica da vegetação projetada por nós diz respeito a adequabilidade ambiental dos biomas (clima e solo) e não considera que haverá uma translocação da biodiversidade de um local para outro. Diferentes fatores determinam a distribuição das espécies, como presença de barreiras humanas, habilidade e velocidade de migração ou mesmo adaptabilidade e aclimatação. Porém, quando a manutenção da biodiversidade não é possível, a mudança na adequabilidade ambiental pode levar a área ao colapso ambiental. Esse colapso de ecossistemas tem sido amplamente apontada por todo o globo, com perda de florestas tanto em regiões tropicais úmidas, quanto em regiões tropicais semiáridas. Mesmo ecossistemas particularmente secos, como a caatinga, está vulnerável ao colapso devido a processos de desertificação impulsionados pelos eventos climáticos extremos.

Frente às mudanças climáticas e às pressões antrópicas, as áreas protegidas (unidades de conservação e terras indígenas) têm sido efetivas em proteger a biodiversidade. Nesse contexto, as terras indígenas destacam-se não somente na proteção da cultura dos povos originários, mas sim na resistência em relação ao desmatamento. Esta representa a categoria de área protegida mais efetiva em regiões de maior pressão antrópica – com atividades de madeireiros e garimpeiros. Porém, do total de 2243 áreas protegidas, 918 serão afetadas em algum grau, das quais 354 terão até 90% de seu território afetado. Dentre as áreas protegidas afetadas, as terras indígenas serão mais impactadas, com 42% sobre sua cobertura afetada (Figura 2). Uma lista de todas as áreas protegidas afetadas pode ser visualizada no anexo da versão original do artigo.


Figura 2. Cobertura das áreas protegidas atingidas pelas mudanças climáticas. (a) terra indígena (marrom); (b) área de proteção de uso sustentável (verde); e (c) área de proteção integral (azul).


A necessidade de ampliação da cobertura de áreas protegidas no país vai além do objetivo tradicional de proteger a biodiversidade, é também parte crucial do objetivo urgente de reduzir o desmatamento e as emissões de carbono. Áreas preservadas próximas a zonas de transição que não serão afetadas pelas mudanças climáticas devem ser alvo de proteção agora para reduzir os impactos na biodiversidade e nos serviços ecossistêmicos. Essas áreas funcionariam como refúgio para espécies imigrantes e ajudariam a preservar os ecossistemas nessas regiões ecotonais. Nesse contexto, recomendamos a criação de áreas protegidas de uso sustentável (ou terras indígenas, quando for o caso) em regiões que não serão impactadas pelas mudanças climáticas, mas que sofrem forte pressão antrópica, para que as comunidades locais possam contribuir para sua conservação e se beneficiar dos serviços prestados por esses ecossistemas inalterados.

As mudanças esperadas na floresta amazônica podem não apenas levar a danos irreparáveis in situ, mas também promover alterações em outras regiões da América do Sul. Devido à interdependência do fluxo de água atmosférica, a Bacia Amazônica pode contribuir com até 29% das chuvas na Bacia do Prata, que inclui partes das regiões centro-oeste, sudeste e sul do Brasil, assim como Uruguai, Paraguai e Argentina. O colapso dos ecossistemas amazônicos pode causar mudanças nos serviços ecossistêmicos nos próximos 30 anos, resultando em graves impactos sociais, migração em massa de populações humanas e perdas econômicas de trilhões de dólares. Diante desse cenário, a luta por políticas rígidas de conservação ambiental deve ser estimulada, principalmente no setor do agronegócio.

O abismo entre a conservação da natureza e o desenvolvimento econômico aumenta sempre que a sociedade se recusa a reconhecer os benefícios da integridade do ecossistema e sua dependência econômica. Estreitar essa lacuna será um dos maiores desafios deste século. Portanto, a manutenção das atuais áreas protegidas e a criação de novas áreas fora das zonas de impacto climático que possam receber espécies migratórias serão ações primordiais para minimizar colapsos iminentes de ecossistemas, com drásticos efeitos econômicos e sociais.


Esse artigo foi originalmente publicado por Daniel Arruda e colaboradores no periódico Austral Ecology em 2023 pode ser lido na íntegra em:


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Palavras-chave: consultoria ambiental, inventário florestal, caracterização de flora, laudo ambiental, licença ambiental, plano de intervenção ambiental, Montes Claros, norte de Minas Gerais, Vale do Jequitinhonha.

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